segunda-feira, 26 de julho de 2010

O CLARO ENIGMA DE MARIZE CASTRO RESENHA DE ASTIER BASÍLIO

Não existem fórmulas
que garantam
uma boa poesia.
Não há receitas. O
fato de Marize Castro,
por exemplo, escrever
poemas curtos, econômicos,
apostar na
simplifi cidade não dá
nenhuma garantia de
que seu trabalho poético
seja bem realizado. O que faz Lábios - espelhos
(Una, Rio Grande do Norte, 2009, 97 págs.)
uma obra de qualidade é algo mais do que a
combinação de um receituário seguido à risca.
Não. É algo imponderável chamado talento.
Marize não se preocupa em ostentações.
Veja o poema “Deus é Mundo” em que ela diz:
pequenas mortes acompanham-me/ Desamparo-
me a cada página/ Ela me disse: Deus é
o mundo./ Desde então, não me encolho mais./
Amplio-me. Há, neste curto texto, dois eixos
fundamentais. O primeiro, a referência a um
eu-lírico, exteriorizado em terceira pessoa,
denominado de “Ela”, referência que atravessa
vários textos. O outro eixo, ou melhor,
mais a revelação de uma estratégia, mostra
uma poeta que esconde suas intertextualidades,
que aposta no simples, é que “pequenas
mortes”, principalmente no idioma francês,
é uma metáfora para orgasmo, elemento que
ilumina a temática erótica e amorosa de seus
textos curtos e fulminantes.
Quem é essa “ela”? Essa “ela” que se insurge
(se eu não escrevo, ela me engole/ come meu
útero./ Meu cérebro...) que, por que não dizer,
se metamorfoseia em várias outras, multidão
de uma só que canta e que anuncia: conduzo
águias/ tropeço em harpas/ troco em harpas/
troco anáguas no jardim/ onde os amantes são
sepultados. Tentando, em vão responder a essa
pergunta, a de quem seja “ela”, a melhor resposta
não é decifrar o enigma, mas de contemplar
o enigma, beijá-lo, como sugere o título,
Lábios - espelho, uma gradação em camadas,
uma caixa de pandora luminosa e, ao mesmo
tempo, opaca, pois, a transparência de Marize
ilusoriamente revela. Eis o jogo, como sugerido
em “silente”: sinto urgência em dizer: calo.

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