Escrever - para que? Para quem?
Como toda arte, a escrita manifesta-se no ser como necessidade de realizar seu eu. Realizar a inquietação, essa habitante assídua da alma do artista, que não consegue se materializar somente na expressão verbal sonora do seu rico pensamento, quando assumi formas, imagens e dilui-se no vazio do espaço prenchido pelo tempo.
Nato é o dom da arte por acompanhar o ser indivíduo (uno), inspirando-o desde seu nascituro em contato com os agentes sensibilizadores de suas qualidades artísticas, motivando-o a se aprofundar no desenvolvimento e aprimoramento da sua produção a ser apresentada ao grande público. Esse trabalho pode ser individual ou coletivo, ocorre durante sua existência de ser pleno, consciente e produtivo.
Essa arte busca caminhos para afirmação através do aperfeiçoamento da sua representação ao longo dos anos vivenciados na perseguição da própria perfeição de expressão.
Há diversificada variedade de linguagens artísticas. O embelesamento dos gestos e movimentos, podem originar coreografias e representações cênicas na linguagem da dança e na da dramaturgia. A utilização de tintas, pincéis, cinzéis, maçaricos, mãos na definição de formas, remete ao vasto campo das artes visuais, em que o espaço joga com a luz e seus expectros e promove a sensação de cor, forma e beleza, enlevadores do espírito pela emoção transmitida pelo pintor, escultor, desenhista. O som em movimento, harmonioso e enfeitiçador, encontra-se nas partituras e ressonâncias instrumentais da musicalidade universal.
Para quem escreve, o mundo, por si só, não o complementa. É necessário criar novos, variados, inusitados e fantásticos mundos. Sua essência em existir reside no ofício de escrever como o oxigênio alimenta sua vida. Encontra na caneta sua válvula de escape. Seu todo. Sua plena realização. Sua terapia. Seu universo. Seu plural. Seus escritos contêm questões, sugestões, análises, avaliações, críticas ou apenas relatos, contestações buriladas em versos ou prosa, ao gosto do escritor, que encontra sua melhor forma de expressão. Nessa magia da escrita, encontra a liberdade de expressar seu pensamento sem esbarrar no obsáculo do recepor direto no diálogo, na conversa, no bate-papo, castrando-lhe argumentos, teses, conclusões. Alternativas apropriadas ao seu enredo enquanto criador de um contexto. Essa liberdade permiti-lhe criar seu trabalho artístico dentro de sua ótica individual relacionada com sua visão de mundo exterior. Esse panorama artístico chega as mãos do leitor, que, também, terá o pleno direito de exercitar a própria liberdade ao realizar sua leitura particular da obra com sua interpretação encontrando novas respostas, novos horizontes além dos propostos anteriormente pelo escritor.
O escrevinhador, quase sempre, é um navegante solitário em seu ofíco. Uma vez que ele detém o controle do seu horizonte literário.
A inquietude das observações e criações literárias mexe com a profundidade do enigma humano. Busca vozes nos signos materiais do jogo das letras e dos sons, fonemas, na investidura da palavra, sagrado canal de comunicação posta na boca e na mão do homem. Assim, fecha o mágico ciclo da comunicação ao encontrar o receptor.
Escrever é perpetuar, documentar a mensagem. Legar à humanidade parte de um indivíduo, que transcende seus limites nas asas libertárias da imaginação, do conhecimento, da sabedoria.
O ofício de escrever parte da premissa da apreensão da linguaguem escrita pelo escrevinhador. Sem esse conhecimento, ou seja, sem dominar a técnica da linguaguem, ele não tem como elaborar textos literários ricamente fluentes em vocábulos, em conhecimento gramatical e linguístico. Sem esses atributos, a arte sepulta-se antes de desabrochar para a vida literária com a precípua finalidade de encantar o leitor.
O encanto do texto literário, trabalho cansativo, embora prazeroso do ofício de escrever, não depende apenas de estilo; não depende apenas da escolha de escola literária em que enquadrar seu texto; nem depende apenas da inspiração. Esse encantamento envolve um conjunto de qualidades e atributos da obra e de seu criador, que a personaliza com sua marca, com seu toque de linguaguem, com sua desenvoltura de narrador, de versejador, de novelista, de contista. Uma marca grafada na sua sensibilidade de articular com maestria as palavras necessárias e fundamentais ao contexto abordado em sua universalidade. Está intrinsicamente vinculado ao domínio do idioma e ao árduo labor da escrita, verdadeiro esmerilador de palavras.
Escrever é dar vida à idéia através do jogo das palavras. Articular com arte o pensamento. Atribuir ao texto além da técnica, emoção, que vivifica a obra e a faz ultrapassar a fronteira do espaço físico, geográfico, material e vencer a barreira do tempo universal. Ser sempre atual em sua mensagem artística literária.
Sonho de qualquer escritor, colher do seu ofício de escrever o fruto para sua sobrevivência. Viver da sua produção artística literária.
No contexto social atual, esse ideal ainda é um mero sonho, uma vez que o grande mercado consumidor de literatura não se encontra culturalmente e educacionalmente preparado, pode-se até dizer, não se encontra apto a comprar o bem cultural livro, por infinitas razões conhecidas pela oferta. As editoras e distribuídoras não se aventuram com desconhecidos. Em Natal, não há grandes editoras para incrementar a produção interna. Os escritores potiguares têm que arcar com todos os custos da obra se desejarem publicar e lançar. É bom frisar que os custos de publicação e lançamento são altíssimos. Escritor sem recursos não tem como publicar. Não há como divulgar sua obra. Não há um mercado consumidor com recursos para absorver a oferta, desses sonhadores do livro. Normalmente, nos lançamentos, só aparecem familiares, amigos e alguns curiosos. As obras não são adotadas pelos colégios, faculdades, universidades. O povo não se preocupa em conhecer a produção da terra, por falta de conhecimento, por falta de interesse e também por falta de uma consciência da própria identidade, quase sempre procurando consumir as obras indicadas por jornais e revistas nacionais, que não divulgam as obras locais.
O ofício de escrever exige uma profissionalização do escritor. Há necessidade que o artista tenha sensibilidade, sentimento, emoção e tenha capacidade de apropriar-se das técnicas literárias, realizando o casamento perfeito para sua produção literária. Há necessidade que o escritor una-se a outros escritores para reivindicar políticas públicas para fortalecer o mercado editorial. A população necessita de conhecimento, de cultura, de educação para construir um pensamento crítico cidadão. O estado tem que acordar para a necessidade de fortalecer o povo realmente como nação plena e digna, pois não há estado sem povo, a não ser apenas um espaço vazio destituído de alma e esperança.
Nesse momento de reflexão, em que se comemora o Dia do Escritor, urge o grito de socorro "do ofício de escrever" jorrando de todas as gargatas secas de saber, de conhecimento, de seus direitos, de seu poder de transformação.
O poder público e a sociedade tem que oferecer mecanismos para a publicação e veiculação do bem cultural livro, fazendo a Lei do Livro do Estado do Rio Grande do Norte sair do papel e ser executada, para oportunizar a população carente ter livros em suas escolas, em suas bibliotecas, e que esses livros sejam lidos realmente pela população, pois não são apenas enfeites de estantes, mas têm um objetivo maior, são repassadores do conhecimento humano de uma maneira lúdica e prazerosa para o encantamento do leitor.
Sem que a sociedade feche o ciclo de produção, divulgação e difusão do ofício de escrever, não há como mudar os velhos paradigmas sociais, econômicos e políticos. A sociedade vai continuar refém da falta de escolas, de empregos, da violência fortalecida pela propagação da ilícita organização do tráfico, fortalecido a cada dia que passa em detrimento da evolução humanitária e igualitária da sociedade em em busca de patamares dignos de vida para sua população.
Um comentário:
Parabéns a todos os escritores pelo seu dia!
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