quarta-feira, 6 de março de 2024

POR GUTENBERG COSTA CARNAVAL EM NATAL HÁ 100 ANOS

Recebendo autógrafo do escritor Gutenberg Costa em Cabarés, na cidade de Natal 


CARNAVAL EM NATAL HÁ CEM ANOS ATRÁS - 1924, texto de Gutenberg Costa, pesquisador do Carnaval Natalense


"O carnaval natalense de 1924 ocorreu a partir do sábado de Zé Pereira, mas sua animação popular de rua só aconteceria em primeiro de março (domingo). Registra antecipadamente o jornal – ‘A República’, de 17 de fevereiro, um domingo, que já ocorriam os ensaios do tradicional bloco “Zé Pereira”, e que iam ser animados nas ruas por uma orquestra da então Polícia Militar. E os referidos ensaios se deram nos salões do ‘Natal Club’, da Cidade Alta. No mencionado Clube social foi registrada a presença de parte da sociedade luxuosamente fantasiada, e entre a mesma o ilustre doutor - ‘Governador José Augusto e respectiva senhora primeira dama’. A carestia nos preços das comidas e bebidas era noticiada pelos jornais da época. Povo, quase de fora dos festejos...O citado e famoso grupo carnavalesco ‘Zé Pereira’ saiu do ‘Natal Club’ e percorreu, animadamente, as principais ruas do centro de Natal, visitando residências de várias personalidades: - “dançando e cantando coisas apropriadas ao carnaval”. A rua mais animada daquele ano foi a Avenida Tavares de Lyra, na velha Ribeira, onde ocorreram as tradicionais “batalhas” de confetes e serpentinas. Também os famosíssimos lança-perfumes. O povo se divertiu nas ruas da Ribeira e Cidade Alta, com as diversas agremiações de ruas, entre elas, o elogiado – “Os Jandaias”, liderado pelo major Emídio Fagundes. O jornalista e poeta Ezequiel Wanderley tomou conta da crônica social do carnaval de 1924, para o jornal ‘A República’, dando ênfase primeiramente aos bailes ocorridos nos elitizados da Cidade Alta - ‘Natal Clube’ e o ‘Terpsichore Club’, bem como o do Teatro Carlos Gomes, da Ribeira.  


As agremiações de turmas mais destacadas em 1924 foram - ‘Os Jandaias’, ‘Fandango Japonês’ e o ‘Zé Pereira’. Os desfiles de automóveis e agremiações foram realizados na Avenida Tavares de Lyra, não mais na apertada Rua da Palha, da Cidade Alta. A banda de músicos da Polícia Militar foi quem animou o Corso, na Ribeira. E, segundo o jornal A República: - Nas noites de domingo, segunda e terça-feira, o ‘Natal Club’ conservou abertos os seus salões... O baile dos ‘Pierrots’, que um grupo de cavalheiros da mais alta sociedade de Natal organizou, no Teatro ‘Carlos Gomes’, para os dias de segunda e terça-feira, pelo apurado gosto que se revestiu, foi à nota chic do carnaval deste ano... 


As músicas e danças tocadas eram as - Tango, Caritó e Fox- trot... Não tinham ainda chegado a Natal o animado frevo pernambucano e nem as marchinhas cariocas. O citado ‘A República’ ainda comenta outro baile elitizado: “O ‘Terpsichore Club’ comemorou, este ano, condignamente as festas em louvor ao momo abrindo seus salões, caprichosamente ornamentados, durante os três dias, onde se reuniram muitas famílias e cavalheiros na mais espontânea cordialidade. Nos intervalos, eram renhidas as batalhas de serpentinas e lança perfumes”.


O balanço do carnaval de 24 foi feito pelo referido jornal ‘A República’, em 05 de março, que deixou o seguinte registro final: “A opinião geral sobre as festas carnavalescas, que terminaram anteontem, e que ocorreram com uma grande animação na melhor ordem, sem uma nota dissonante, deixando em todos que assistiram a melhor impressão. É certo que, para isto, concorreu, em grande parte o espírito ordeiro e bem educado da nossa população e as medidas acertadas previamente tomadas pela Chefatura de Polícia... Nos três dias, até a madrugada de ontem, a animação nas ruas, sobretudo na Avenida Tavares de Lyra, foi extraordinária.   


O pouco que sabemos sobre o carnaval em 1924 diz respeito aos elitizados e concorridos bailes nos Clubes sociais de sua época, da Cidade Alta e Ribeira. Nada sobre o nosso animado povão de ruas. Os melados, sujos e papangus. Até parece que o então cronista social Ezequiel Wanderley (1872-1933) não pisou em nossas ruas e bares para registrar a irreverência animação tão tradicional e antiga do ‘mela-mela’, jogando cinzas, cal e água suja, com alegria, uns nos outros. 


Câmara Cascudo (1898-1986), com seus olhos de águia, já nos chamava a atenção para o fato de que até os padres não podiam sair às ruas e voltar ‘limpos’ às suas casas. ‘Absurdos irreverentes’, desde o tempo dos Entrudos, os quais eram contestados pelas ditas autoridades policiais e a nossa elite. Elite... elite que só frequentava os bailes com fantasias luxuosas e suas caras compradas, vindas dos Navios, nas lojas ‘Paris’ e na ‘Natal’ antiga da viúva Machado. Dizem, sabiamente, que quem contou a nossa história deu de ombros para a alegria popular das ruas e suas boemias."


Nísia Floresta (RN), 14 de fevereiro de 2024

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