CARNAVAL EM NATAL HÁ CEM ANOS ATRÁS - 1924, texto de Gutenberg Costa, pesquisador do Carnaval Natalense
"O carnaval natalense de 1924 ocorreu a partir do sábado de Zé Pereira, mas sua animação popular de rua só aconteceria em primeiro de março (domingo). Registra antecipadamente o jornal – ‘A República’, de 17 de fevereiro, um domingo, que já ocorriam os ensaios do tradicional bloco “Zé Pereira”, e que iam ser animados nas ruas por uma orquestra da então Polícia Militar. E os referidos ensaios se deram nos salões do ‘Natal Club’, da Cidade Alta. No mencionado Clube social foi registrada a presença de parte da sociedade luxuosamente fantasiada, e entre a mesma o ilustre doutor - ‘Governador José Augusto e respectiva senhora primeira dama’. A carestia nos preços das comidas e bebidas era noticiada pelos jornais da época. Povo, quase de fora dos festejos...O citado e famoso grupo carnavalesco ‘Zé Pereira’ saiu do ‘Natal Club’ e percorreu, animadamente, as principais ruas do centro de Natal, visitando residências de várias personalidades: - “dançando e cantando coisas apropriadas ao carnaval”. A rua mais animada daquele ano foi a Avenida Tavares de Lyra, na velha Ribeira, onde ocorreram as tradicionais “batalhas” de confetes e serpentinas. Também os famosíssimos lança-perfumes. O povo se divertiu nas ruas da Ribeira e Cidade Alta, com as diversas agremiações de ruas, entre elas, o elogiado – “Os Jandaias”, liderado pelo major Emídio Fagundes. O jornalista e poeta Ezequiel Wanderley tomou conta da crônica social do carnaval de 1924, para o jornal ‘A República’, dando ênfase primeiramente aos bailes ocorridos nos elitizados da Cidade Alta - ‘Natal Clube’ e o ‘Terpsichore Club’, bem como o do Teatro Carlos Gomes, da Ribeira.
As agremiações de turmas mais destacadas em 1924 foram - ‘Os Jandaias’, ‘Fandango Japonês’ e o ‘Zé Pereira’. Os desfiles de automóveis e agremiações foram realizados na Avenida Tavares de Lyra, não mais na apertada Rua da Palha, da Cidade Alta. A banda de músicos da Polícia Militar foi quem animou o Corso, na Ribeira. E, segundo o jornal A República: - Nas noites de domingo, segunda e terça-feira, o ‘Natal Club’ conservou abertos os seus salões... O baile dos ‘Pierrots’, que um grupo de cavalheiros da mais alta sociedade de Natal organizou, no Teatro ‘Carlos Gomes’, para os dias de segunda e terça-feira, pelo apurado gosto que se revestiu, foi à nota chic do carnaval deste ano...
As músicas e danças tocadas eram as - Tango, Caritó e Fox- trot... Não tinham ainda chegado a Natal o animado frevo pernambucano e nem as marchinhas cariocas. O citado ‘A República’ ainda comenta outro baile elitizado: “O ‘Terpsichore Club’ comemorou, este ano, condignamente as festas em louvor ao momo abrindo seus salões, caprichosamente ornamentados, durante os três dias, onde se reuniram muitas famílias e cavalheiros na mais espontânea cordialidade. Nos intervalos, eram renhidas as batalhas de serpentinas e lança perfumes”.
O balanço do carnaval de 24 foi feito pelo referido jornal ‘A República’, em 05 de março, que deixou o seguinte registro final: “A opinião geral sobre as festas carnavalescas, que terminaram anteontem, e que ocorreram com uma grande animação na melhor ordem, sem uma nota dissonante, deixando em todos que assistiram a melhor impressão. É certo que, para isto, concorreu, em grande parte o espírito ordeiro e bem educado da nossa população e as medidas acertadas previamente tomadas pela Chefatura de Polícia... Nos três dias, até a madrugada de ontem, a animação nas ruas, sobretudo na Avenida Tavares de Lyra, foi extraordinária.
O pouco que sabemos sobre o carnaval em 1924 diz respeito aos elitizados e concorridos bailes nos Clubes sociais de sua época, da Cidade Alta e Ribeira. Nada sobre o nosso animado povão de ruas. Os melados, sujos e papangus. Até parece que o então cronista social Ezequiel Wanderley (1872-1933) não pisou em nossas ruas e bares para registrar a irreverência animação tão tradicional e antiga do ‘mela-mela’, jogando cinzas, cal e água suja, com alegria, uns nos outros.
Câmara Cascudo (1898-1986), com seus olhos de águia, já nos chamava a atenção para o fato de que até os padres não podiam sair às ruas e voltar ‘limpos’ às suas casas. ‘Absurdos irreverentes’, desde o tempo dos Entrudos, os quais eram contestados pelas ditas autoridades policiais e a nossa elite. Elite... elite que só frequentava os bailes com fantasias luxuosas e suas caras compradas, vindas dos Navios, nas lojas ‘Paris’ e na ‘Natal’ antiga da viúva Machado. Dizem, sabiamente, que quem contou a nossa história deu de ombros para a alegria popular das ruas e suas boemias."
Nísia Floresta (RN), 14 de fevereiro de 2024
Nenhum comentário:
Postar um comentário