Olá!
Segue um texto de minha autoria, abordando as condições históricas que
precederam a eleição de uma mulher para presidente de nosso país. Publique-o,
se lhe aprouver.
Desde já grata,
Rizolete
TEM SIMONE DE BEAUVOIR NA ELEIÇÃO DE DILMA
Rizolete Fernandes
Um dia após as eleições em segundo turno deste 2010 recebi, virtualmente, os
cumprimentos de um amigo francês pela eleição de Dilma Rousseff. Em meus
agradecimentos, lhe disse: Tem Simone de Beauvoir nessa história, ao que ele
me devolveu, com gentileza: Temos muito que aprender com vocês. Seus
patrícios deixaram de eleger presidenta a socialista Ségolène Royal no pleito
de 2007.
O contato reavivou a lembrança de nosso conhecimento em Fortaleza, cidade que
recebia a edição anual da SBPC nos idos de 1979. Dentre as muitas atividades
que caracterizam esse evento, ali teve lugar a primeira reunião dos grupos de
mulheres que começavam a se organizar por todo o país, com o objetivo de
discutir sua situação desigual e encaminhar formas unificadas de luta por
direitos civis e políticos.
Naquela ocasião, o Brasil ainda amargava a ditadura militar e a sociedade civil
buscava na reorganização dos movimentos sociais um caminho para a
redemocratização. Ao incipiente movimento de mulheres, Simone de Beauvoir
fornecia referencial teórico para a discussão. Ela havia publicado o famoso
livro O segundo sexo, de 1949, abordando as condições sócio-históricas que
formam a mulher para a submissão, cuja leitura se tornara obrigatória não
apenas para as brasileiras, mas para as mulheres de todo o mundo inconformadas
com a secular discriminação.
Esse e o fim do regime de exceção pontuavam as conversas que extrapolavam o
conclave para adentrar as noites da capital alencarina, onde um jovem cantor de
voz nasalada chamado Fagner começava a fazer sucesso. E prenunciavam a vida
longa da amizade que acabara de nascer. De lá para cá, o conterrâneo de Sartre,
que à época morava em Recife, transferiu-se para João Pessoa, lecionou durante
anos na UFPB e retornou à França, onde continua ensinando e desenvolvendo
pesquisas.
Eu ajudei a organizar grupos de mulheres em meu Estado, vi o movimento feminista
se fortalecer com o surgimento de entidades nacionais, a exemplo da Articulação
de Mulheres Brasileiras; contribui para a criação de organismos na estrutura
governamental voltados para execução de políticas públicas de interesse das
mulheres; acompanhei iniciativas que, a grandes penas, modificaram a nosso
favor o arcabouço legal; e participei da primeira das duas conferências
nacionais convocadas para discutir e encaminhar temas que nos dizem respeito,
sob a égide oficial. Embora insuficientes, são conquistas inegáveis.
Nos dias que transcorrem, ninguém mais parece lembrar de que há apenas 80 anos
às mulheres era negado o direito de votar, tampouco causa espanto se uma delas
decide se candidatar a qualquer cargo público, inclusive para dirigir nações.
Foi assim no dia 31 de outubro passado quando, depois de uma campanha acirrada,
o Brasil elegeu uma mulher para dirigir seu destino nos próximos quatro anos. Ao
obter quase 47 % dos votos válidos, a candidata situacionista Dilma Rousseff
também garantiu para si o título de primeira Presidente do Brasil.
No sóbrio discurso proferido logo após o anúncio oficial da vitória, entre
agradecimentos de praxe e ratificação do compromisso com o projeto político que
representa, a presidenta eleita fez questão de dedicar a vitória às mulheres, às
quais prometeu honrar em sua gestão, arrematando com a frase: Sim, a mulher
pode!. Surpreendeu, pois deixara de lado a discussão de políticas públicas
específicas durante o embate eleitoral. Mas reacendeu em quem fez parte da luta
feminista, no meu caso a partir dos anos 70 um orgulho acompanhado do sentimento
de realização.
Por todos os percalços enfrentados no início, como o descrédito de boa parte da
sociedade, para a qual o movimento era coisa de mulher desocupada, pelas
horas de trabalho extra dedicadas à causa, pela tristeza dos primeiros
insucessos, as mulheres que protagonizaram pioneirismos, transgrediram, ousaram
e continuam ousando, devem ter sentido, como senti, a alma abraçada com essa
eleição que, em última instância, re-significa a trajetória e diz da
importância de lutar.
As felicitações do amigo recordaram que tem Simone de Beauvoir nessa vitória,
sim. E um olhar acurado para a história vai mostrar que tem Nísia Floresta,
Chiquinha Gonzaga, Berta Lutz, Nise da Silveira, Celina Guimarães Viana, Alzira
Soriano, Ana Montenegro, Betty Friedan, Pagu, Leila Diniz, numa seqüência que
chega ao presente com Sílvia Pimentel, Gilda Cabral, Jacqueline Pitanguy,
Lourdes Bandeira, Bethânia Ávila, Guacira Cesar, Sueli Carneiro, Maria
Aparecida Schumaher, Fátima Oliveira, Maria da Penha, Estelizabel, Iáris
Cortês, Elizabeth Nasser, Analba Brazão ...
Citando contato@natalpress.com:
Segue um texto de minha autoria, abordando as condições históricas que
precederam a eleição de uma mulher para presidente de nosso país. Publique-o,
se lhe aprouver.
Desde já grata,
Rizolete
TEM SIMONE DE BEAUVOIR NA ELEIÇÃO DE DILMA
Rizolete Fernandes
Um dia após as eleições em segundo turno deste 2010 recebi, virtualmente, os
cumprimentos de um amigo francês pela eleição de Dilma Rousseff. Em meus
agradecimentos, lhe disse: Tem Simone de Beauvoir nessa história, ao que ele
me devolveu, com gentileza: Temos muito que aprender com vocês. Seus
patrícios deixaram de eleger presidenta a socialista Ségolène Royal no pleito
de 2007.
O contato reavivou a lembrança de nosso conhecimento em Fortaleza, cidade que
recebia a edição anual da SBPC nos idos de 1979. Dentre as muitas atividades
que caracterizam esse evento, ali teve lugar a primeira reunião dos grupos de
mulheres que começavam a se organizar por todo o país, com o objetivo de
discutir sua situação desigual e encaminhar formas unificadas de luta por
direitos civis e políticos.
Naquela ocasião, o Brasil ainda amargava a ditadura militar e a sociedade civil
buscava na reorganização dos movimentos sociais um caminho para a
redemocratização. Ao incipiente movimento de mulheres, Simone de Beauvoir
fornecia referencial teórico para a discussão. Ela havia publicado o famoso
livro O segundo sexo, de 1949, abordando as condições sócio-históricas que
formam a mulher para a submissão, cuja leitura se tornara obrigatória não
apenas para as brasileiras, mas para as mulheres de todo o mundo inconformadas
com a secular discriminação.
Esse e o fim do regime de exceção pontuavam as conversas que extrapolavam o
conclave para adentrar as noites da capital alencarina, onde um jovem cantor de
voz nasalada chamado Fagner começava a fazer sucesso. E prenunciavam a vida
longa da amizade que acabara de nascer. De lá para cá, o conterrâneo de Sartre,
que à época morava em Recife, transferiu-se para João Pessoa, lecionou durante
anos na UFPB e retornou à França, onde continua ensinando e desenvolvendo
pesquisas.
Eu ajudei a organizar grupos de mulheres em meu Estado, vi o movimento feminista
se fortalecer com o surgimento de entidades nacionais, a exemplo da Articulação
de Mulheres Brasileiras; contribui para a criação de organismos na estrutura
governamental voltados para execução de políticas públicas de interesse das
mulheres; acompanhei iniciativas que, a grandes penas, modificaram a nosso
favor o arcabouço legal; e participei da primeira das duas conferências
nacionais convocadas para discutir e encaminhar temas que nos dizem respeito,
sob a égide oficial. Embora insuficientes, são conquistas inegáveis.
Nos dias que transcorrem, ninguém mais parece lembrar de que há apenas 80 anos
às mulheres era negado o direito de votar, tampouco causa espanto se uma delas
decide se candidatar a qualquer cargo público, inclusive para dirigir nações.
Foi assim no dia 31 de outubro passado quando, depois de uma campanha acirrada,
o Brasil elegeu uma mulher para dirigir seu destino nos próximos quatro anos. Ao
obter quase 47 % dos votos válidos, a candidata situacionista Dilma Rousseff
também garantiu para si o título de primeira Presidente do Brasil.
No sóbrio discurso proferido logo após o anúncio oficial da vitória, entre
agradecimentos de praxe e ratificação do compromisso com o projeto político que
representa, a presidenta eleita fez questão de dedicar a vitória às mulheres, às
quais prometeu honrar em sua gestão, arrematando com a frase: Sim, a mulher
pode!. Surpreendeu, pois deixara de lado a discussão de políticas públicas
específicas durante o embate eleitoral. Mas reacendeu em quem fez parte da luta
feminista, no meu caso a partir dos anos 70 um orgulho acompanhado do sentimento
de realização.
Por todos os percalços enfrentados no início, como o descrédito de boa parte da
sociedade, para a qual o movimento era coisa de mulher desocupada, pelas
horas de trabalho extra dedicadas à causa, pela tristeza dos primeiros
insucessos, as mulheres que protagonizaram pioneirismos, transgrediram, ousaram
e continuam ousando, devem ter sentido, como senti, a alma abraçada com essa
eleição que, em última instância, re-significa a trajetória e diz da
importância de lutar.
As felicitações do amigo recordaram que tem Simone de Beauvoir nessa vitória,
sim. E um olhar acurado para a história vai mostrar que tem Nísia Floresta,
Chiquinha Gonzaga, Berta Lutz, Nise da Silveira, Celina Guimarães Viana, Alzira
Soriano, Ana Montenegro, Betty Friedan, Pagu, Leila Diniz, numa seqüência que
chega ao presente com Sílvia Pimentel, Gilda Cabral, Jacqueline Pitanguy,
Lourdes Bandeira, Bethânia Ávila, Guacira Cesar, Sueli Carneiro, Maria
Aparecida Schumaher, Fátima Oliveira, Maria da Penha, Estelizabel, Iáris
Cortês, Elizabeth Nasser, Analba Brazão ...
Citando contato@natalpress.com:
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