Nísia Floresta - Escrevinhadora
de uma nova História Feminina
Por Jania Souza, Natal, RN,
Brasil
“Certamente Deus criou as mulheres para ter um melhor fim, que para
trabalhar em vão toda a sua vida.” – Nísia Floresta, em “Direito das Mulheres e Injustiça dos Homens”
– 1832.
Com essas palavras registradas na
obra citada acima e estampada em estandarte na sala do museu dedicado à ilustre escritora
feminista brasileira nascida em Papari (cidade rebatizada com o nome da sua nobre filha) localizada no estado do Rio Grande do Norte, o visitante
começa sua jornada sobre a vida da autora Nísia Floresta, que revolucionou os
conceitos machistas da sua época sobre a mulher no Brasil e tornou-se precursora da luta feminina na
América Latina por igualdade de oportunidades civis, profissionais e
intelectuais com o homem no século XIX.
Além da bandeira empunhada pela
causa feminina, essa forte e valorosa mulher também foi uma brava lutadora pelas
causas: abolicionista, indianista e republicana. Deixou um legado de exemplo,
garra, virtude, persistência, dignidade e força para as novas gerações de quaisquer
gêneros. Foi educadora, escritora, filósofa, poeta, feminista, ativista
política por declarar suas opiniões e crenças nos quais fundamentou suas ações.
De imbatível coragem, jamais se deixou vencer a qualquer pretexto. Essa é a
principal razão que lhe concede a honra de figurar na Coletânea Mulheres
Exemplares já falecidas da Associação Cajamarca, Identidade e Cultura do Peru (organizada por seu Presidente Guillermo Bazán
Becerra) por ser representante ímpar da nação brasileira no contexto mundial por sua
brilhante trajetória na luta pelo direito da educação da mulher e dos oprimidos.
Nísia Floresta, uma
Mulher Exemplar!
Em 12 de outubro de 1810, o
Brasil ainda era colônia de Portugal. Porém, em virtude das guerras
napoleônicas na Europa, teve que abrigar a família real portuguesa desde 1808,
fato que tornou o Rio de Janeiro capital do reino. Nesse contexto social e político foi que nasceu
a filha do advogado português Dionísio Gonçalves Pinto com a viúva brasileira
Antônia Clara Freire. A criança ao ser batizada recebeu o nome de Dionísia Gonçalves
Pinto em homenagem ao seu genitor garantindo-lhe uma aliança de segurança e
proteção até a morte de seu pai, anos depois, já em sua juventude. Foi criada na
bela fazenda “Sítio Floresta” em Papari, sua terra natal. Durante toda a
infância e adolescência teve contato com a população nativa composta por índios,
negros e brancos e as ideias progressistas paterna. Vivenciou os
relacionamentos e conflitos gerados pelas questões econômicas e sociais do seu tempo
bastante conturbado em todas as esferas humanas, sociais e políticas, influenciadoras na formação do caráter dessa menina que se transformou em grande mulher.
A figura paterna sempre exerceu
muita influência em seu pensamento e concedeu força em sua formação de vida. Provavelmente
foi alfabetizada por ele. Por causa da nacionalidade portuguesa, seu pai teve que abandonar a fazenda em Papari,
motivado pela sua vizinhança com a cidade de São José de Mipibu, local que
centralizava os ânimos libertários nas redondezas da capitania do Rio Grande subordinada a de Pernambuco. Esses ideais separatistas comprometiam a segurança dos
lusos habitantes na localidade, durante os
momentos cruciais que marcaram o fortalecimento do pensamento de ruptura com a
colonização na América Latina, especificamente no nordeste do Brasil. Inclusive com lutas no solo brasileiro. Momento em que eclodiu a "Revolução de 1817" organizada em Pernambuco contra a Coroa Portuguesa. O Padre Miguelinho, nascido no Rio Grande, foi seu principal líder e mentor sediado na cidade do Recife. Contou com grande adesão de conterrâneos potiguares, chefiados
pelo maior proprietário de terras da província e dono do Engenho de Cunhaú,
André de Albuquerque Maranhão, com triste e dramático desfecho a favor de Portugal. Dionísio partiu de suas terras, onde também
era escultor e, com a família, mudou-se para a Vila de Goiana em Pernambuco onde
passou pouco tempo. Pela mesma razão da fuga, é obrigado a retornar à fazenda
Floresta, outra vez, por causa da sua condição de português não ser confortável
em Pernambuco, em virtude da derrota da revolução, que puniu duramente os
envolvidos no conflito, deixando um sabor de desamor pelos portugueses na região
Nordeste.
Quando do retorno da família a
Papari, em 1819, a menina de 9 anos foi educada com direito à expressão do
próprio pensamento. Ainda criança, aos treze anos precisamente, seguindo a
orientação cultural da época ou talvez por ter se apaixonado, não se sabe ao
certo, casa-se com o herdeiro rico de poderoso proprietário de terras, Manuel
Alexandre Seabra de Melo no ano de 1823. Sentiu-se infeliz naquela relação
incompreensível para sua pouca idade. Rebela-se passados alguns meses com a
situação e foge para sua casa paterna, onde volta a ser acolhida com amor.
Esses momentos são decisivos na formação de seu pensamento em busca de melhores
condições para a figura da mulher na sociedade em seu futuro.
Logo, em seguida, foi deflagrado
outro levante separatista republicano intitulado de "Confederação do Equador" no
ano de 1824, que teve como principal articulador Frei Caneca em Pernambuco. Por
essa causa seu pai volta com a família para a Vila de Goiana por acreditar ser
mais segura que o “Sítio Floresta”. Após sua partida, a fazenda é invadida,
pilhada e saqueada. Roubam todos os bens e destroem a casa. Em Goiana,
acredita-se que Nísia Floresta tenha frequentado o Convento das Carmelitas fundado no século XVII, local para estudo de moças pertencentes a famílias de posses, em virtude
do seu conhecimento em línguas estrangeiras e fortalecimento do seu pensamento
crítico muito à frente da sua realidade regional.
A família fixou residência na
cidade de Olinda em 1824, onde seu pai passou a advogar. Quando Nísia se
encontrava com 18 anos de idade, em 1828, seu genitor sofreu trágica morte ao
ser assassinado em uma emboscada na cidade do Recife, vítima de um desafeto
ocasionado por uma ação judicial ganha contra a influente família Cavalcanti.
Nísia não se calou e escreveu sobre o ocorrido.
Nessa ocasião, solitária e
desamparada com sua mãe, irmãs e um irmão, passa a viver com o estudante de
Direito da Faculdade de Olinda, Manuel Augusto de Faria Rocha com quem teve três
filhos. O segundo faleceu ainda recém-nascido. Essa importante decisão reafirmou seu
compromisso com sua liberdade de escolha fora da prática usual da época em que
viveu. O seu primeiro casamento não havia sido anulado, nem havia
regulamentação de divórcio em sua época. Continuava com o contrato de casamento
e suas implicações legais.
Em 1830, nasce sua filha Lívia
Augusta de Faria Rocha em Olinda, Pernambuco.
Em 1831, publica artigos no
jornal “Espelho das Brasileiras” de Olinda, iniciando sua carreira literária.
Publica sua obra mais marcante em
1832, que a imortaliza como primeira feminista brasileira. Esse trabalho
atravessa séculos sempre muito atual na luta da mulher. Foi editado e lançado
na cidade do Recife sob o título de “Direito
das Mulheres e Injustiça dos Homens” quando tinha apenas 22 anos de idade
com o pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta. Livro inspirado na obra Vindication of the rights of women de 1792 da escritora Mary
Wollstonecraft. Nísia Floresta realiza a tradução e explana seu pensamento
sobre a matéria tendo como foco a situação da mulher no Brasil.
Em virtude da perseguição de seu
primeiro marido decidido a processá-la por abandono do lar e adultério, muda-se
com seu novo companheiro, filha, sua mãe e irmãs para o estado do Rio Grande do
Sul. Onde se aprofunda em seus estudos e pesquisas.
Envereda-se pelo caminho das letras e da educação, norteando suas ideias e seus
ideais registrados em seus quinze livros publicados ao longo da sua vida; suas
posturas e colocações profissionais fazem enfrentamento à sociedade machista, escravocrata e aristocrática.
Em 1833, chega a cidade de Porto
Alegre, capital gaúcha, acompanhando o seu companheiro com demais familiares. Dar à luz ao seu
terceiro filho Augusto Américo de Faria Rocha. O pai de seus filhos falece
nesse mesmo ano. Bastante abalada, torna-se a gestora da família. Eclodi a Revolução
das Farroupilhas, em 1835. Muda-se para o Rio de Janeiro em 1837 com a família e
funda o Colégio Augusto em 1838, para a educação de mulheres com orientações
nas áreas das Ciências, Geografia, Literatura e dos idiomas Latim, Francês,
Italiano e Inglês. Defensora da prática da Educação Física, adota-a em seu
colégio. A inauguração ocorreu durante o Império de D. Pedro II, que havia
aprovado a educação feminina no Brasil restrita às prendas domésticas em 1837.
Fato que lhe gerou enormes críticas de opositores.
Para corroborar essa afirmação,
parte do artigo do Autor – Elfi Kürten Fenske, Nísia
Floresta Brasileira Augusta, Uma Mulher à frente de seu tempo publicado no site:
https://tokdehistoria.com.br/2017/01/27/nisia-floresta-brasileira-augusta-uma-mulher-a-frente-de-seu-tempo/
“Dionísia
Gonçalves Pinto (Nísia Floresta).. [Papary {hoje Nísia Floresta} RN,
12.10.1810 – Rouen, França, 24.4.1885]. Com o pseudônimo de Nísia
Floresta Brasileira Augusta, foi educadora, “viajante ilustrada”,
“nacionalista”, “pré-feminista”, escritora, abolicionista, ativista dos
direitos humanos, indianista e republicana. Mostrou uma preocupação filosófica
com o cotidiano brasileiro da época em que viveu e se dedicou a propor uma
reforma na educação das meninas no Brasil. Preocupou-se, principalmente, com a
educação e o papel das mulheres em nossa sociedade, acreditando que o progresso
de uma sociedade dependia da educação que era oferecida às meninas. Para Nísia
Floresta, as meninas deveriam estudar porque a mulher exerce uma influência
real sobre o destino de seu marido e sobre os destinos das nações e as meninas
deveriam ser educadas para terem o reconhecimento da sociedade.
Nísia
Floresta escreveu sobre os direitos das mulheres e viabilizou o acesso à
educação de algumas meninas, lutando para que elas valorizassem os estudos. Foi
uma educadora que encarou a educação das meninas como uma missão, além de ter
discutido a questão indígena de forma singular, valorizando o papel das
mulheres, e de ter provocado as autoridades da época ao questionar sobre o
poder e a supremacia dos homens brancos. Suas críticas atingiam também mulheres
que deixavam os seus filhos e filhas nos braços das amas de leite.
Ensinava os valores necessários a uma educadora e afirmava que as
mulheres poderiam ocupar os cargos públicos. Defendia a ideia de uma nação
civilizada que só chegaria a esse patamar se as mulheres fossem educadas e
participassem do contexto social.
Nísia
Floresta desafiou uma cultura onde as mulheres não eram valorizadas. Superou
diversos opositores, fundou colégios para meninas – como o Colégio Augusto –
cobrando, assim, o acesso das mulheres ao campo do saber.”
Em
1842, publica “Conselhos à Minha Filha”, sua obra mais traduzida e editada em
várias partes do mundo.
Em
1847, são publicados os livros ‘Daciz ou a Jovem Completa” e “Discurso que as
suas Educandas Dirigiram à Nísia Floresta”.
Em
1849, publica a “Lágrima de um Caeté”e muda-se para a Europa para tratar da
saúde da filha Lívia. Mantem contato em Paris com cientistas, intelectuais e
com a aristocracia.
Em
1850, em Niterói, no Rio de Janeiro, é publicado “Dedicação de uma Jovem”.
Em
1851, conhece Auguste Comte em uma palestra sobre Filosofia Positivista.
No ano
de 1853, chega ao público sua obra com 62 artigos sobre a educação da mulher –
“Opúsculo Humanitário”.
Em
1855, publicação de “Páginas de uma Vida Obscura” e “Passeio ao Aqueduto da
Carioca”. Morre sua mãe e grande apoiadora, Antônia Clara Freire. Torna-se
voluntária no Hospital Nossa Senhora da Conceição no Rio de Janeiro durante a
epidemia de Febre Amarela.
Em
1856, publica “O Pranto Filial”; “Pensamentos” e no jornal “O Brasil
Ilustrado”. Retorna à Europa.
Em 1857, comparece ao sepultamento de Auguste
Comte. Publica em Paris ”Itinéraire d’um Voyage em Allemagne”.
Em
1858, publica “Consigli a Mia Figlia” na Itália. Em 1859, sai a publicação em
francês e publica em Florença “Scintille d’un Anima Brasiliana”.
Em
1860, monta residência em Florença e publica em italiano “A Lágrima de um
Caeté”. Em 1861, volta para Paris.
Em
1867, em Londres é publicado “A Mulher” traduzido por sua filha para o inglês.
Em
1878, publica seu último livro “Fragments d’un Ouvrage Inèdit: Notes
Biographiques” em Paris. Segue para Rouen e depois para Bonsecours onde
permanece.
Em
1885, falece em Bonsecours na França de pneumonia. Seus restos mortais foram
trasladados de Rouen na França para a cidade de Papari no Rio Grande do Norte,
Brasil, retornando definitivamente a terra mãe, da qual foi apartada por razões
superiores e fora de seu controle, mas que lhe permitiu se apropriar do mundo e
ser a escrevinhadora de uma nova história da mulher. Seu corpo ao chegar
encontrou Papari rebatizada com o seu nome de Nísia Floresta em 1954. Hoje, repousa
na terra em que veio à vida, na Fazenda “Sítio Floresta” perpetuada em seu
coração através do pseudônimo que adotou de Nísia Floresta Brasileira Augusta,
quando da sua primeira publicação em 1832.
A essa
mulher de excepcional valor, cuja coragem levou-a a lutar com palavras e livros
contra o velho mundo arcaico do machismo, escravocrata, colonialista e
monárquico, o agradecimento dos oprimidos no universo feminino e humanitário,
que tiveram a privação dos seus direitos civis de cidadãos menosprezados em qualquer
época da civilização. Nísia Floresta, a heroína de ontem, para reforçar e
garantir a liberdade da mulher para sempre. A luta ainda não acabou. Só acabará
quando houver uma consciência plena de amor e respeito entre todos os homens e
todas as mulheres de qualquer gênero, de qualquer etnia, de qualquer poder
econômico e cultural. Mas temos total esperança no amanhã.
Referências e fonte de pesquisa:
blogueirasfeministas.com/2014/08/nisia-floresta-a-primeira-feminista-brasileira/
https://pt.wikipedia.org/wiki/Nísia_Floresta_(escritora)
educacaointegral.org.br/reportagens/nisia-floresta/
http://nisiaflorestaporluiscarlosfreire.blogspot.com.br/2015/05/historia-de-nisia-floresta-por-luis.html
www.sinasefeifes.org.br/nisia-floresta-a-primeira-feminista-brasileira/
nisiaflorestaporluiscarlosfreire.blogspot.com/.../historia-de-nisia-floresta-por-luis.html
Museu Nísia Floresta no município cujo nome homenageia a
escritora no estado do Rio Grande do Norte, Brasil
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